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Bacharel em Comunicação Social - Publicidade e Propaganda - pela Usp. Período em que trabalhou como designer e professora de artes gráficas. Mestra em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Unesp. Contou com apoio da Fapesp para sua pesquisa, que versa sobre os procedimentos artísticos modernos e contemporâneos, sobretudo no que diz respeito à colagem. Atua paralelamente como curadora independente.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O colecionismo no Brasil do século XXI

Este foi o título do seminário promovido pela revista ARTE!Brasileiros no Auditório do Ibirapuera ontem.

O evento, muito bem organizado, foi composto por quatro mesas que tiveram as seguintes diretrizes: 

1) A importância das diretrizes políticas e de políticas públicas para a formação de coleções.
2) A formação de coleções públicas e privadas.
3) O que podemos fazer para que grandes coleções privadas tenham acesso ao público.
4) Formas contemporâneas de difusão: programas educacionais, acervos digitais, patrimônio material e ações efêmeras.

No primeiro destes debates, foram tratadas as dificuldades estruturais dos espaços expositivos brasileiros; a falta de políticas públicas para aquisição de obras, que evitem repetições de obras e ausências de outras; a diminuição das doações de colecionadores particulares para espaços públicos, preferindo criar espaços próprios para exposição de suas obras a fim de evitar que estas fiquem apenas nas reservas técnicas de museus; a dificuldade na aquisição de trabalhos artísticos contemporâneos por parte do governo por conta dos altos preços praticados pelo mercado.

O secretário municipal de cultura da cidade de São Paulo, Carlos Augusto Machado Calil, apresentou sua experiência na gestão da "Coleção de Arte da Cidade". Trata-se de um acervo formado por 2.800 obras em papel que esteve guardada por anos na Biblioteca Mario de Andrade e nos anos 1980 foi transferida para o CCSP - Centro Cultural São Paulo - sem nenhuma condição técnica de ser aí exibida. 

A solução encontrada foi emprestar algumas obras em comodato para a Pinacoteca do Estado durante as últimas décadas a fim de evitar a degradação e no próximo ano pretende-se ocupar a Chácara Lame, um dos espaços do Museu da Cidade - projeto que estimula a visitação de construções históricas da cidade.

Todos os palestrantes ressaltaram a importância de tornar as coleções de arte públicas, independente de sua estatização, entendendo tornar público como levar a coleção ao maior número de pessoas, ainda que com iniciativa privada. Este tipo de atitude ajudaria a diminuir o descompasso entre a potente economia brasileira e seu vergonhoso desenvolvimento social, educacional e cultural.

No entanto, o advogado Evaristo Martins de Azevedo, presidente da Comissão de Direito às Artes da OAB, lembrou que as questões legais e tributárias do país minam parte da boa vontade na concretização deste objetivo. Alguns dos exemplos que deu foram: a entrada de um prêmio como o Oscar no Brasil obriga seu ganhador a pagar altos impostos, o que faz com que este pense duas vezes antes de querer trazê-lo ao pais; a Lei Rouanet, por sua vez, fez com que as instituições públicas tivessem que lutar também por patrocínio ao invés de terem uma verba garantida para sua manutenção advinda do governo.

No segundo debate, discutiu-se a necessidade de encarar a arte como um bem comum da humanidade, nas palavras crítico, historiador e professor Frederico Morais. Para ele, a obra de arte, quando saída do ateliê não pertence mais nem a seu criador, visto que adquire novos significados. 

Ressaltou ainda sua utopia da criação de uma coleção nacional única, com catalogação de todas as obras presentes no Brasil, oferecendo maior transparência e facilidade para pesquisa e circulação. Frederico acredita que isso evitaria a repetição excessiva de obras, tendências, movimentos e curadores, contendo a especulação do mercado de arte. Fez ainda uma brincadeira com o perfil ideal de um colecionador: solteiro e sem filhos. Pois os herdeiros normalmente cercam as obras de exigências, direitos autorais e dificultam as relações com os museus.

O museólogo e curador Fábio Luiz Pereira de Magalhães comentou sobre a mudança no perfil dos colecionadores. Em primeiro lugar, estão se desfazendo de obras modernas para investir em trabalhos contemporâneos, em função da valoração do mercado. Outra característica é o crescimento do número de colecionadores jovens, com idade entre 30 e 40 anos, provenientes, sobretudo, do mercado financeiro. 



Fábio contou de sua experiência à frente Macs - Museu de Arte Contemporânea de Sorocaba. Este museu foi uma iniciativa de um grupo de empresários em uma das cidades com maior PIB do Brasil e que não possuía qualquer aparelho cultural disponível para a população. O espaço se ocupa, em especial, de fotografias e arquitetura

Durante a mesa 3 podemos perceber as diferenças nos entraves à formação de uma coleção de arte nos Estados Unidos e na América Latina. Enquanto lá não há taxas sobre importação ou exportação de obras de arte, aqui a tributação é imensa.


Na Argentina, de acordo com o fundador do Malba - Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires - , Eduardo Costantini, o imposto pago para aquisição de obras de arte é de 40%, semelhante ao valor pago sobre qualquer outro bem de consumo. Além disso, um cidadão pode doar apenas 20% de seu patrimônio para uma instituição, o restante deve ser obrigatoriamente destinado à família como herança. Estes fatos ressaltam a importância da família para a sociedade latina, mas dificultam as doações para acervos públicos.

Situação parecida foi descrita por Patrick Charpenel no México, Cecilia Fjardo-Hill na Venezuela e João Carlos de Figueiredo Ferraz no Brasil.

Este último, fundador do Instituto Figueiredo Ferraz em Ribeirão Preto foi enfático ao afirmar que não há interesse em arte e cultura no Brasil, porque não se valoriza a educação e isso é comprovado pelos impostos abusivos e pela falta de preparo e sensibilidade dos burocratas. 

Para ele, o governo não possui política de aquisição de obras e fica como urubus esperando que os colecionadores morram para garantir seus acervos sem custo. Além disso, há uma confusão por parte do estado entre cultura e lazer, vista em eventos como a Virada Cultural, quando na verdade cultura deveria estar associada à educação.

Em contrapartida, nos Estados Unidos, há incentivos para a criação de fundações e a movimentação nas artes. A fundadora da Cisneros Fontanals Art Foundation, Ella Fontanals Cisteros, contou sua experiência na criação do Museu de Arte de Miami a partir de seu acervo.

Para ela é uma obrigação social do colecionador a divulgação da arte e dos artistas, criando um mercado para estes. Assim, além das exposições, a fundação oferece prêmios a artistas jovens latino-americanos.

Por último, assistimos ao discurso de pessoas como João Cândido Portinari, que liderando o Projeto Portinari conseguiu reunir, catalogar e propagar a obra de seu pai aos recantos mais esquecidos do Brasil.

Seu relato emocionou por demonstrar que a divulgação da cultura e da arte é ainda um objetivo de idealistas apaixonados, mas que é possível realizar este sonho quando se acredita nele. João Cândido acredita que a obra de seu pai foi mais do que um arranjo de cores e formas e por isso sente o compromisso social de levar os valores tratados nas pinturas ao maior número possível de pessoas.


Vimos ainda exemplos como Inhotim, o educativo da Bienal de São Paulo e o KOS Museum of Art in Public Spaces na Dinamarca.

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